Direitos humanos: sobre a universalidade rumo a um direito internacional dos direitos humanos
Indice 1. Introdução 2. Os Direitos Humanos 3. Breve Histórico 4. Direitos Humanos e e globalização 5. Universalismo e relativismo nos direitos humanos 6. Rumo a um Direito Internacional dos Direitos Humanos 7. Conclusão 8. Referências bibliográficas
O conceito e as declarações dos direitos humanos preconizam que todo indivíduo pode fazer reivindicações legítimas de determinadas liberdades e benefícios. Os direitos humanos são uma idéia política com base moral e estão visceralmente relacionados com os conceitos de justiça, igualdade e democracia. Eles são uma expressão viva do relacionamento que deveria prevalecer entre os membros de uma sociedade e entre indivíduos e Estados. Os direitos humanos devem ser reconhecidos em qualquer Estado, grande ou pequeno, pobre ou rico, independentemente do sistema social e econômico que essa nação adota. Nenhuma ideologia política que não incorpore o conceito e a prática dos direitos humanos pode fazer reivindicações de legitimidade. Apesar dos vários tratados e declarações adotados com a consciência e o consenso da comunidade internacional a triste realidade é que nenhum dos direitos declarados é respeitado uniformemente no mundo inteiro. A adoção pela Assembléia Geral das Nações Unidas da Declaração Universal de Direitos Humanos, em 1948, constitui o principal marco no desenvolvimento da idéia contemporânea de direitos humanos. Os direitos inscritos nesta Declaração constituem um conjunto indissociável e interdependente de direitos individuais e coletivos, civis, políticos, econômicos, sociais e culturais, sem os quais a dignidade da pessoa humana não se realiza por completo. A Declaração transformou-se, nesta última metade de século, numa fonte de inspiração para a elaboração de diversas cartas constitucionais e tratados internacionais voltados à proteção dos direitos humanos. Este documento, chave do nosso tempo, tornou-se um autêntico paradigma ético a partir do qual se pode medir e contestar a legitimidade de regimes e Governos. Os direitos ali inscritos constituem hoje um dos mais importantes instrumentos de nossa civilização visando a assegurar um convívio social digno, justo e pacífico. No entanto, a maciça violação dos direitos e liberdades básicos faz com que o ideal de uma vida digna e decente para todos os cidadãos do mundo torne-se algo ainda muito distante. Ao mesmo tempo, vivemos em uma era que apresenta oportunidades, únicas para levar adiante a causa dos direitos humanos. A fase beligerante da Guerra Fria, em cujo nome cometeu-se e justificou-se tantos abusos, acabou. Os movimentos para a democracia, guiados por um compromisso de promover os direitos humanos, continuam obtendo bons resultados em todo o mundo. E, finalmente, há o reconhecimento crescente de que o respeito aos direitos humanos é imperativo para a sobrevivência de toda a humanidade. No entanto, há quem afirme, por exemplo, que a mutilação do clitóris de mulheres no mundo islâmico seria um componente cultural integrado à cultura islâmica, e, portanto, amplamente legitimado. Essa concepção, relativizadora dos Direitos Humanos, contrapõe-se à universalidade da categoria dos Direitos Humanos colocada fundamentalmente a partir do racionalismo jusnaturalista do século XVII e à tendência cada vez mais objetiva da globalização desses mesmos direitos que, para sua garantia e eficácia necessitam por parte da comunidade internacional um tratamento protetivo específico, em relação à normatividade já existente através das Declarações, Pactos e Tratados. Eis pois, o objeto deste breve trabalho de iniciação científica, no qual, fruto da pesquisa bibliográfica realizada, buscar-se-á apresentar, ainda que sem a pretensão de ter por esgotado o tema, a atualidade da discussão relativa à universalidade dos direitos humanos no marco do processo de globalização em curso no planeta, no marco da configuração de um novo ramo do Direito Internacional ligado aos Direitos Hunamos.
Iniciar-se-á discorrendo, ainda que brevemente, sobre o significado da expressão Direitos Humanos, apresentando uma síntese histórica de sua trajetória desde a Revolução Francesa de 1789 até os dias de hoje, além da configuração das diversas gerações de Direitos Humanos existentes. A seguir serão apresentadas algumas considerações acerca do fenômeno da globalização mundial e da internacionalização dos Direitos Humanos, processo em pleno curso neste final de milênio, trazendo concretude aos ideais de universalidade dos direitos humanos constantes da Declaração de 1948. Entretanto, apresenta-se também algumas críticas ao modo de como a globalização está sendo concretizada entre os diversos países, em particular relativa às questões econômicas e ambientais. Será abordada, ainda que de forma não exaustiva, a polêmica entre a universalidade dos Direitos Humanos em contraposição ao relativismo destes diante das especificidades culturais e religiosas, utilizando-se para tal alguns exemplos da atualidade. Far-se-á uma abordagem relativa à emergência de um novo ramo do Direito, ou seja, o Direito Internacional dos Direitos Humanos, com princípios e regras próprias do Direito Internacional, fruto de todo o cabedal acumulado a partir dos diversos tratados, convenções, pactos e protocolos existentes. Significado da expressão A questão relativa às várias denominações dos direitos humanos, pode ser convergida para uma só: Direitos Fundamentais. É o que aponta a lição de José Luiz Quadros de Magalhães, para quem "quando falamos em Direitos Humanos, utilizamos esta expressão como sinônimo de direitos fundamentais." A partir da visão de Cançado Trindade, pode-se vislumbrar que os direitos humanos têm um lugar cada vez mais considerável na consciência política e jurídica contemporânea e os juristas só podem se regozijar com seu progresso. Implicam eles com efeito um estado de direito e o respeito das liberdades fundamentais sobre as quais repousa toda democracia verdadeira, e pressupõem a um tempo um âmbito jurídico pré-estabelecido e mecanismos de garantia que assegurem sua efetiva implementação. Os direitos humanos tendem a tornar-se, por todo o mundo, a base da sociedade. Impende, portanto, conhecer a noção do que são direitos humanos ou direitos fundamentais. Nessa tarefa, pode-se incorrer em tautologias, no sentido de afirmar que direitos humanos são os da humanidade ou os do homem, ou coisas do gênero. Ensina Antônio Enrique Perez Luño que os direitos humanos são: "Un conjunto de facultades e instituciones que, en cada momento histórico, concretan las exigencias de la dignidad, la liberdad y la igualdad humanas, las cuales deben ser reconocidas positivamente por los ordena-mientos jurídicos a nivel nacional e internacional." As diversas gerações de Direitos Humanos A primeira geração dos direitos humanos formalmente emoldurados – direitos individuais, foi gestada no século XVII, com a formulação da doutrina moderna sobre os direitos naturais, que embasou ideologicamente a luta que culminou com a criação do Estado Moderno e a transição do sistema feudal para o capitalismo. O direito de liberdade era a garantia da livre iniciativa econômica, livre manifestação da vontade, livre câmbio, liberdade de pensamento e expressão, liberdade de ir e vir, liberdade política, mão-de-obra livre. A segunda geração dos direitos humanos – os direitos metaindividuais, coletivos ou difusos, é resultado do embate entre as forças sociais, que se dá com o desenvolvimento do modelo burguês de sociedade, de um Estado liberal que se consolida através de um espetacular desenvolvimento da economia industrial. Compreendem os Direitos Sociais, os direitos relativos à saúde, educação, previdência e assistência social, lazer, trabalho, segurança e transporte. Os Direitos Econômicos são aqueles direitos que estão contidos em normas de conteúdo econômico que viabilizarão uma política econômica. Classifica-se entre direitos econômicos, pelas características marcantes destes direitos, o direito ao pleno emprego, transporte integrado à produção, e direitos do consumidor. Os Direitos políticos são direitos de participação popular no poder do Estado, que resguardam a vontade manifestada individualmente por cada eleitor sendo que a sua diferença essencial para os direitos individuais é que, para estes últimos, não se exige nenhum tipo de qualificação em razão da idade e nacionalidade para o seu exercício, enquanto que para os Direitos Políticos, determina a Constituição requisitos que o indivíduo deve preencher. A terceira geração de direitos humanos – os denominados direitos dos povos ou direitos da solidariedade, também é fruto das lutas sociais e das transformações sócio-político-econômicas ocorridas nesses últimos três séculos de história da humanidade e que resultaram em conquistas sociais e democráticas que envolveram as expectativas em torno de temas do interesse geral, quais sejam, a biodiversidade, o meio-ambiente, entre outros. Por fim fala-se já numa quarta geração de direitos ligados à comunicação, à democratização da informação, entre outros. As Declarações de Direitos A preocupação com os Direitos do Homem começa com o estabelecimento da ordem burguesa, associada à idéia de liberdade e igualdade. Os Estados Unidos foram o primeiro país a formular expressamente uma declaração de direitos do homem, a de Virgínia, em 1776. É, no entanto, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, que obteve maior expressão, devido às repercussões da Revolução Francesa. A constituição francesa de 1791 incorpora a Declaração de 1789, e a partir daí os direitos do homem ingressam no constitucionalismo moderno, expressos nos direitos do cidadão. Ressalte-se o perfil liberal dos direitos consagrados nas constituições burguesas, cuja concepção revela-se formal e abstrata, sem considerar as condições materiais de sua aplicação. A incorporação dos Direitos Humanos à ordem internacional é decorrência de um longo período de avanços e retrocessos políticos e sociais. Paulatinamente os Estados começaram a estabelecer normas internacionais que, embora não reconhecessem a personalidade, pretendiam proteger a pessoa humana. De tal forma que, a princípio, ainda no século XIX, é proibido o tráfico de escravos, para somente ao tempo da Liga das Nações, serem criadas normas relativas à proteção das minorias, a proibição do tráfico de mulheres e de armas. Os Direitos Humanos pós Segunda Guerra Mundial Após a 2� Guerra Mundial sente-se a necessidade de criar mecanismos eficazes que protejam os Direitos Fundamentais do homem nos diversos Estados. Já não se podia mais admitir o Estado nos moldes liberais clássicos de não intervenção. O Estado está definitivamente consagrado como administrador da sociedade e convém, então, aproveitar naquele momento, os laços internacionais criados no pós-guerra para que se estabeleça um núcleo fundamental de Direitos Internacionais do Homem . É desta forma que se fará a Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948, a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (Bogotá, 1948), a Convenção Americana dos Direitos do Homem, assinada em 22 de novembro de 1.969, em São José da Costa Rica, entre outras declarações, convenções e pactos, além de organizações não estatais, sendo que entre estas organizações, atuam hoje com maior destaque, a Anistia Internacional, a Comissão Internacional dos Juristas, o Instituto Interamericano de Direitos Humanos, este último, com sede na Costa Rica, tendo como finalidade a divulgação de idéias e a educação em Direitos Humanos. Entretanto, o mundo pós Segunda Guerra, após um curto período de calma encontra a novidade da divisão do mundo em duas áreas de influência: uma norte americana e a outra soviética. Assiste-se neste período à investida norte americana contra o Vietnã, Cuba, Granada, Nicarágua e quase todos os países latino-americanos que receberam regimes autoritários apoiados pelos Estados Unidos. A tortura, as perseguições e assassinatos praticados pelo Estado e por grupos para-militares é comum no Chile, na Argentina, Uruguai, Brasil, Honduras e El Salvador. Do outro lado, o exército soviético impõe, à força, a política soviética na Hungria, Tchecoslováquia, Afeganistão. O processo de libertação das colônias africanas é doloroso e cruel, protagonizado por aqueles mesmos países que se comprometeram a respeitar os Direitos Humanos de 1948 os quais violam de forma agressiva estes direitos. É o caso da França na Argélia. As colônias portuguesas após uma longa guerra de libertação, recebem seus países arrasados, sendo que o difícil processo de reconstrução é tumultuado quando não impedido por movimentos guerrilheiros em Moçambique e Angola, financiados pelo governo do aparthied sul-africano e o democrático norte-americano. A partir de 1989, com a queda do Muro de Berlim e o processo que culminou com o esfacelamento da Ex-URSS, o mundo se depara com uma nova realidade na correlação das forças políticas e ideológicas, com o avanço da democracia nos países que outrora configuravam o bloco comunista. Entretanto, constata-se que a mesma ordem econômica mundial que favorece os países desenvolvidos é responsável pelo extermínio de adultos e crianças diariamente em todo o chamado terceiro mundo, por fome e pela violência gerada pela injustiça social, que gera o atraso cultural, o trabalho escravo, a prostituição infantil, a exclusão social e econômica e avilta a condição humana de muitos em benefício exclusivo de uns poucos detentores do poder local. Esta realidade é o desafio para os teóricos dos Direitos Humanos, responsáveis pela divulgação da idéia, pela formação de consciências, único meio eficaz de se realizarem os Direitos Humanos. 4. Direitos Humanos e e globalização O fenômeno da globalização A globalização ou internacionalização é um fenômeno que envolve as mais variadas relações entre pessoas e entre instituições, resultando do profundo desenvolvimento da ciência e da tecnologia, principalmente no campo da comunicação, numa redefinição dos papéis dos Estados, dos indivíduos, das comunidades, da sociedade, das empresas e dos novéis blocos político-econômicos regionais. Renato Sócrates Pinto leciona que este processo que se dá nos vários campos da atuação humana, não tem um vetor comum, contudo os resultados alcançados e os que estão por ser, têm o condão de possibilitar uma maior interação das relações, seja no nível da economia, seja no nível da cultura, enfim, seja em qual nível for, entre as pessoas e instituições em todos os quadrantes do globo terrestre. Indiscutivelmente, só se atingiu esse estágio de interrelacionamento graças, sobretudo, ao formidável desenvolvimento científico, tecnológico e dos meios de comunicação. O saber e a notícia, durante longo tempo privativos de uns poucos e por isso mecanismo de controle e uso do poder, estão se diluindo, aos poucos deixarão de pertencer a uma casta privilegiada. Ademais, com a globalização rediscute-se o valor e o papel dos Estados-soberanos e das fronteiras nacionais em face dos blocos regionais e dos indivíduos e das pequenas comunidades ou tribos. Atualmente, como notam alguns especialistas, o paradigma clássico das Ciências Sociais, baseado nas sociedades nacionais, está sendo substituído por outro, o da sociedade global, levando à reformulação dos conceitos clássicos de soberania e de hegemonia, ainda firmemente arraigados na doutrina política e jurídica das nações. A globalização ou internacionalização dos direitos humanos é uma das mais importantes questões do final deste século. No entanto, "o grande problema deste tema é que ele versa sobre a essência da relação política, isto é, Poder e pessoa, isto é, quanto mais direitos do homem menos Poder e vice-versa." Os ideais de universalidade dos direitos humanos defendidos pela ONU desde de sua criação, manifestados com a Declaração Universal do Direitos do Homem, 1948, estão adquirindo uma maior consistência, a despeito da evidente constatação de desrespeitos em vários pontos do mundo. Contudo, recentemente na II Conferência Mundial de Direitos Humanos, Viena, 1993, foram temáticas principais a pobreza, a democracia e os instrumentos legais e jurídicos de efetivação dos direitos humanos. A preocupação internacional sai da retórica e procura a concretude. Tal como o afirma Cançado Trindade, percebe-se com clareza que "há uma tendência para o processo de construção de uma cultura universal de observância dos direitos humanos." Assim, a globalização não ocorre apenas em razão da intensa circulação de bens, capitais, informações e de tecnologia através das fronteiras nacionais, com a conseqüente criação de um mercado mundial, mas também em função da universalização dos padrões culturais e da necessidade de equacionamento comum de problemas que afetam a totalidade do planeta, como o combate a degradação do meio ambiente, a proteção dos direitos humanos, o desarmamento nuclear, o crescimento populacional etc. Algumas críticas ao processo da globalização Uma das críticas que é feita contra a globalização, sobretudo a econômica, é em razão do aviltamento imposto contra o homem. A filosofia do lucro acima de tudo cega a visão do homem como o bem supremo. Mais do que nunca a sociedade internacional tem que ficar alerta aos jogos de poder, canalizados muito mais pelos interesses econômicos do que por princípios humanitaristas. Quanto ao rol de direitos humanos que estão globalizados, um outro merece a atenção de todos, que é a questão ambiental. Os malefícios ambientais, independentemente donde sejam causados, têm conseqüências em todo o globo, de acordo com a proporção do dano, é claro. Vaticina Cançado Trindade pela imposição de particular realce à questão da relação entre a proteção dos direitos humanos e a proteção ambiental um tratamento sistematizado, dado a sua transcendental importância em nossos dias. Ao preconizar que muito embora tenham os domínios da proteção dohomem e da proteção ambiental sido tratados até o presente separadamente, é mister buscar maior aproximação entre eles,pelo fato de correspoderem aos principais desafios de nosso tempo, a afetarem em última análise os rumos e destinos do gênero humano. Outro fator deveras importante em sede de globalização dos direitos humanos e proteção ambiental reside nas obrigações erga omnes. Aponta desse modo o autor retro referenciado: "Pode-se atestar a globalização da proteção dos direitos humanos e da proteção ambiental também a partir de um enfoque distinto, qual seja, o da emergência de obrigações erga omnes e os conseqüêntes declínio e fim da reciprocidade. No campo da proteção dos direitos humanos, a reciprociedade é superada e suplantada pela noção de garantia coletiva e considerações de ordre public. Isto opera uma revolução nos postulados do direito internacional tradicional. Os tratados de direitos humanos incorporam obrigações de caráter objetivo, voltados à salvaguarda dos direitos dos seres humanos e não dos Estados, com base em um interesse público geral superior (ou ordre public). Donde a especificidade dos tratados de direitos humanos." O debate travado na Eco 92, no Rio de Janeiro, centrou no fato de que a proteção ambiental e a racionalização dos recursos naturais, sobretudo nos países subdesenvolvidos, requer um sacrifício de empregos e oportunidades econômicas. É um testemunho sintomático da dialética entre pobres e ricos. "É de se observar que os recursos fornecidos pelos ricos são apenas para a ecologia e não para o homem no sentido do Terceiro Mundo vir a erradicar a miséria, quando não há maior poluição do que a miséria."
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